sexta-feira, 29 de maio de 2015

e sei que piso um astro

Luis Ricardo Falero
como tudo é real como tudo respira
porque a terra é única e ninguém a engana
áspera e dura suave e sempre nova
por ela levanto este archote de resina ou de sal em chamas
porque nela renasço como tudo renasce e sou uma árvore
com o pulso de argila
ou uma onda vibrante do seu peito profundo
o clamor monótono de suas entranhas vermelhas
...
eu sou o homem renascido que vê a rosa viva do mundo
e sei que piso um astro e estou no círculo da metamorfose ardente
tudo é possível porque sou o fogo amante
...
ela é um barco ou animal de terra e sangue
é o músculo do mar em pleno estio
é o desejo do oásis o oásis do desejo
...
o seu andar de adolescente marinha desenha sobre a areia o voo de um pássaro

António Ramos Rosa

terça-feira, 19 de maio de 2015

Choque, ruína e síncope.

Por favor não editem meus livros.

Não os quero corrigidos. 
img.: Victor Pacini
Não os quero prensados, 
costurados, constrangidos, grampeados. 
No fundo nem os quero comprados 
- mas te faço e envio um a 14 reais.

Não os quero presos nas prateleiras ou encalhados no fundo das caixas que fedem papelão. Não os quero presos nas fendas do orgulho ou da breve situação.

Não quero que a vizinha me veja na televisão, nunca, não. 
Deixa-me ser esta incógnita que leva os filhos à praça à lamberem sorvetes de frutas quando é verão e que no fim do mês tem de ir ao supermercado. 

Por favor sr. editor esqueça hoje mesmo o email que mandei ontem. Apertei "enviar" mas era gatilho. Não poderei dizer de mim que sou bonita ou eu mesma ou que fui esperta e sorrir sem ser a vez. Não sei reagir à elogios e à qualquer tipo de crítica inundar-me-ão mil lágrimas e o colapso. Ou síncope, é certo.

Não quero autografar montanhas de pilhas de livros rigorosamente iguais para uma fila dos que possam estar apenas atrás de algo expresso. Dói-me o pulso pensar as assinaturas corridas e é certo que me servirão água engarrafada plasticamente. Tudo meu precisa de ar tipo atmosférico. O que sai de mim é natural: estou à beira da cachoeira escambando livros por pedras solares ou peixes frescos.

sábado, 9 de maio de 2015

Inerme

Adjetivo
Que não tem armas ou meios de defesa.


Botânica
Que não tem acúleos ou espinhos.


Zoologia
Diz-se do animal sem ferrão, bicos, pontas: tênia inerme.

Da arte de escrever do cume calmo

Escrevem através do conhecimento pessoal, e portanto empregam suas mentes concretas na tarefa de estabelecer este conhecimento em termos que revelarão a verdade àqueles que têm olhos para ver, e contudo ocultarão aquilo que for perigoso, do curiosos e do cego. Esta é uma tarefa difícil de cumprir, porque a mente concreta expressa o abstrato de maneira muito inadequada e, na tarefa de incorporar a verdade às palavras, muito do verdadeiro significado se perde.

Alice Bailey

Para dentro e para todos

tem uma parte - por dentro é azul
não é vista ou tocada nem sentida
mas é a que mais tem, existe e é.

pode ser telegrafada
- não por telégrafo!

para ir tem que rasgar o céu
ou cair.