segunda-feira, 25 de julho de 2016

mônada


tudo passa inclusive a gente
mas algo ou molécula
fica pra sempre

domingo, 24 de julho de 2016

numa tábua de esmeralda

O que está abaixo é como aquilo que está acima, e o que está acima é semelhante a aquilo que está abaixo, para realizar os prodígios da coisa única. Assim como todas as coisas foram produzidas pela mediação de um ser, assim também todas as coisas foram produzidas a partir deste ser por adaptação. O seu pai é o sol, sua mãe é a lua. Ele é a causa de toda perfeição por todo e qualquer lugar da terra. O seu poder é perfeito se ele for transformado em terra. Separe a terra do fogo, o sutil do grosseiro, agindo prudentemente e com critério. Eleve-se com a maior sagacidade desde a terra até o céu, e então desça de novo para a terra, e unifique o poder das coisas inferiores e superiores. Assim você possuirá a luz do mundo inteiro e toda escuridão fugirá de você. Esta coisa tem mais força que a própria força, porque ela domina todas as coisas sutis e permeia todas as coisas sólidas. Através dela o mundo foi criado.

Hermes Trismegisto

na terra como no céu



Img.: Martin Hill

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Abertura

Deus, deus!
Como tudo é bonito!
Não, olhem só,
Olhem como tudo é bonito!
Era um grito do seu coração.
Górki

Bailem quando estiverem destroçados.
Bailem quando retirarem sua venda violentamente.
Bailem quando se encontrarem no meio da luta.
Assim, digam e continuem dizendo:
- Teremos caído no lugar onde tudo é arte. 
Rumi



O segredo, de Denise Levertov

Duas meninas descobrem o segredo da vida no inesperado verso de um poema.
Eu, que não conheço o segredo, escrevi esse verso.
Elas me disseram (por um terceiro) que o tinham achado
mas não qual era ele nem sequer qual o verso.
É claro que 
agora, uma semana depois,
 já esqueceram
 o segredo, o verso e o nome do poema.
Eu as amo 
por terem encontrado o que nunca encontrei,
e por me amarem, a mim que escrevi o verso,
e por já o terem esquecido, de modo que,
mil vezes, até que a morte as alcance,
elas podem tornar a descobri-lo,
em outros versos, em outros fatos.
E as amo por 
desejarem conhecê-lo, por presumirem que existe tal segredo, sim,
por isso sobretudo.
Denise Levertov
(postado por Carlito Azevedo no facebook)
http://deniselevertov.blogspot.com.br/

quarta-feira, 22 de junho de 2016

clarividente

pousar as  mãos ao teclado é não dormir com o barulho da complexidade das narrativas. a força imensa do conhecimento. tudo o que tiver de visto, ouvido, lido, falado e escrito vai ficar guardado no grande computador, memória atemporal da natureza, a qual sonho visitar. na dimensão virtual entoei meus livros. um que se chama botânica, outro, floresta. são sugestivos, e frescos. a floresta de agora guarda teus segredos, sinto um desejo folha. quero escrever no tempo das folhas. sei que para ouvir a voz da floresta terei de colher os segredos, e comê-los.
com os olhos de agora, harpia, thc se vê
um vicking em nova york, moondog (têm de conhecer moondog!)
os mendigos leitores imundos inundos
os poetas que sonham abrir cafés de frente pro mar (patti smith)
a dona da hospedaria que tem um rio por detrás e que sonhava com clepsidra acho que era eu.
em 1267 eu morri pois cai da torre de um castelo. achei de uma dignidade.
quero sonhar que sou irmã de giordano bruno, que fui um marinheiro, que converso com saint exupery. imprimo o livro de são joão da cruz, porque seu nome tem um lugar sagrado na escrita da simone weil e na de maria gabriela llansol. acho que irei morrer aos 88 anos como o poeta português antónio ramos rosa. se na minha vila houvesse um padre poeta como josé tolentino mendonça, ia assistir à tudo que ele fala. um padre, poeta, leitor das grandes obras literárias.

minha glandula pineal fabrica dmt quando sonho que voo? ou quando vejo aquelas paisagens num verde indescritível? quem vai me responder esta pergunta? à quem pergunto? à psilocibina? ao terence mckenna, que morreu?
perguntarei à inteligencia alienígena quando estiver pronta.

tenho fumado muito. o tabaco e a ganja me suspendem deste mundo. da forma como ficava suspensa jovem pisando sementes. converso sobre mushroom com o filho iaman. ele chora porque teme que eles queiram ficar comigo assim que descobrirem que gosto de estudar. só agora o entendo melhor. eu vou voltar, filho. e só irei com ajuda xamã experiente.

Diga que as provou

A vida vai te quebrar.
Ninguém pode protegê-lo disto, nem tampouco vivendo sozinho, por solitude a vida irá também quebrá-lo junto com seu anseio. Você tem que amar. Você tem que sentir. Esta é a razão para você estar aqui na terra. Está aqui para arriscar seu coração. Você está aqui para ser engolido. E quando acontece de você estar quebrado ou traído, ou para a esquerda ou ferido, ou a morte chega perto, deixe-se sentar sob uma macieira e ouvir as maçãs caindo ao seu redor, em montes, desperdiçando sua doçura. Diga que as provou como muitos, quantas pode.

Martim
https://soundcloud.com/m-ms

segunda-feira, 20 de junho de 2016

glossolalia da psilocibina

alguns minutos pra escrever
rápido o que houve:
afundei num livro em edição portuguesa
lá flui e aflui e fui
à tona de novo
me trouxe por gritos
e pelo olhar harpio ....... a buscar os pastos
sobre cogumelos
sonho com cogumelos
que a textura é boa, sabor bom
o que me fez lembrar de blake e rilke
e adous huxley e no terence mckenna
outro ahaaaraah. lamento não ali estar o
giordano bruno ou até mesmo o dr. mesmer
cheguei. agora são 4:20
hora de thc e de me incomodar com o pagode à fora
(não pode ser minha esta canção entoada à toa, entornada)
anseio melhor
corro ponho allen ginsberg pra dar seu uivo
lembro de onde vim
tudo bem.

sem tintas não pinto o quadro.
com palavras escrevo um e trago.
ah deus quem dera a glossolalia da psilocibina!
amém. oxalá. virá.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

os giros

giros! os giros! velha face rochosa, olha à frente! 
podem deixar-se de pensar coisas pensadas longamente 
pois a beleza nasce da beleza e o valor nasce do valor 
e esvai-se todo antigo lineamento 
a terra, está manchando-a irracional rio sangrento 
... 
que importa se na crista um mudo pesadelo se segura 
e o corpo sensitivo o manchem sangue e lodo? 
que importa? não suspires, e não caia nenhum pranto 
foi-se um tempo maior e de maior encanto 
e por formas pintadas e por caixas de pintura 
em velhas tumbas eu chorei, não vou chorar após 
que importa? da caverna ergue-se uma voz 
e tudo o que ela sabe é isto: regozija-te de todo! 

fazem-se rudes a conduta e a obra, e rude a alma faz-se 
que importa? aqueles que preza a rochosa face 
os amadores de cavalos e mulheres, tais irão 
desenterrar do mármore ou da sepultura espedaçada 
ou do escuro entre a doninha fétida e a coruja, desse lado 
ou de qualquer negro e opulento nada 
o obreiro, o nobre e o santo, e as coisas todas correrão 
outra vez neste giro já antiquado.

w. b. yeats

segunda-feira, 6 de junho de 2016

amor por antônio

poema para antônio ramos rosa,
o homem que escreveu  a frase
estou vivo e escrevo sol
e que morreu aos 88 anos


não adiemos a poesia 
que vem do amor 
da natureza
por nossos olhos
pele e coração

não deixemos a palavra perfeita que vem do cimo cume

alto indo desvairar ou cair largada, não
num salto colhemo-na de mãos abertas não prostradas
ousaremos-a no ouro 
que não ostenta o lar divino onde está antônio em seu caminho de onde nos olha e nos canta em livros-matéria palavras claras do ar estou vivo e escrevo antônio ser de bege areia e das palavras a ouro
alumia teus poetas desgraçados mas com olhos ainda brilhantes de restarem vivos segurando o mastro ou arado do que deve ser falado ousado dizer quem vai crer? poetas, ovnis, vos sou sol vinde à nós criancinhas numa viagem através duma nebulosa estamos vivos e escrevemos sol leva de nós grande abraço para antônio em agradecimentos

domingo, 5 de junho de 2016

sobre o poema

Num poema, se nos perguntamos porque é que tal palavra está em tal sítio, e se há uma resposta, ou o poema não é de primeira ordem, ou o leitor nada compreendeu. Se podemos legitimamente dizer que a palavra está ali para exprimir tal ideia, ou para a ligação gramatical, ou para a rima, ou para uma aliteração, ou para preencher o verso, ou para uma certa coloração, ou mesmo por vários motivos desse género ao mesmo tempo, houve busca de efeito na composição do poema, não houve verdadeira inspiração. Para um poema verdadeiramente belo, a única resposta é que a palavra está ali porque convinha que estivesse. A prova dessa conveniência é que ela está ali e o poema é belo. O poema é belo, quer dizer que o leitor não deseja que seja outro. 

Simone Weil

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Narração

teresa burgos
o cenário tem uma beleza narrativa.
ceifa-se a narração fica só

só com si e
com sol.

toda narrativa humana é ínfima
como todo o átomo é ínfimo
e o átomo íntimo é só o que vai guardar
toda a sua narrativa, ó indivíduo.

podes me narrar, podemos nos narrarmos
mas sempre será mais que isto.

depois da embriaguez do vinho,
dos cimos de thc, um milhar de baseados,
pílulas, partículas,
livros e outras miríades narrativas
dê-me ó deus aos teus
o conforto desta ânsia de
por uma molécula dmt
ir ter certeza contigo em teu segredo no
óh, mais alto orgasmo estelar!

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Enxergo a égua parida

michele cunha
enxergo a égua parida
e tudo acende

o mundo trota cabisbaixo
o homem que era tão alto
corcundou

a vaca quer ir lá mas tá a cerca ali
o párida que andar pro norte mas há fronteira lá
o viandante me recusa o livro pois quer pão

não não não
e sim

enxergo a égua parida
e tudo ascende

terça-feira, 3 de maio de 2016

Flores tais

Raymond Booth
oferto flores tais
como tú
que é mais que elas
por dar a elas afeição

sou  aquele que aquém
lhe estende um buquê
de flores não colhidas
cujos
caules deixei à terra
as flores no cimo
soam tão agradecidas

se as arrancasses, deus!
morria o amor que é vivo
por ser nosso
delas
da terra inteira, pro nosso olhar
admirar

quinta-feira, 21 de abril de 2016

reza

onde não há janela
ponha uma delas
escancarada

vai entrar

sexta-feira, 1 de abril de 2016

sábado, 27 de fevereiro de 2016

prestes a plantar

- a brisa ventou antigamentes.

(não sei se esta frase é minha ou de algum poeta falecido.)

ezra pound disse:
- prestem atenção à condução tonal das vogais.

eu disse:
- prestem pra plantar altas tonais florestais.

- ergo leve. quero ir junto.
assim disse zaratustra,
quando a brisa o ventou antigamentes.

o poema contínuo

não me surpreende ninguém ter ousado resenhar este livro. quisera ter esta honra mas confesso , não foram poucos os poemas em que meus olhos apenas percorreram as letras sem entender o mínimo sentido do máximo ofertado. com certeza foi dado à Helder o mastro das melhores palavras e dos vínculos entre elas. os poemas colhidos das laranjas, mármores, corolas, humus, das alturas profundas nos é ofertado mas não numa bandeja. há em mim uma angústia por não alcançar esse todo imenso. nunca li algo assim. que desconcerto. em poeta algum. resta deitar vênia a este homem poderoso, detentor deste cedro-pena que esculpiu esse poema contínuo. e almejar, visceralmente, numa releitura futura, alcançar um novo porcento de tudo que Herberto abraça, depois ergue. me esforcei por não abandonar este livro, como se segurasse um raio quente de luz demais. fui mais adiante, vou até o fim, mas há ainda um caminho por onde merecer esta obra. estou parada na porta, esperando ser atendida.